Coletivo de Mulheres compilam texto sobre relacionamentos ABUSIVOS


Com um tema bem sugestivo. "Uma sobe e puxa a outra" O blog Sisal com Dende reúnem coletivo de mulheres para compilarem num único texto, ABUSOS por parte de seus respectivos parceiros. Confira: 

Por: Barbara Anunciação
Ilustrações: google/divulgação

*Esse texto está organizado de forma intercalada com depoimentos de mulheres que passaram por relacionamentos abusivos, mas que não serão identificadas. Os depoimentos não foram encaixados no texto por autoria e sim com relação ao contexto.

*O texto provavelmente tem problemas com os gêneros das palavras, porém aqui o foco é o relacionamento em que a mulher é a vítima, principalmente em relações héteros, mas não esquecendo que o problema também ocorre em relações homoafetivas.
 
Relacionamento abusivo é algo nocivo, porém muito comum. Infelizmente, quem está fora do relacionamento consegue perceber e identificar bem mais do que quem está dentro dele, o que causa muitos julgamentos, principalmente direcionados às mulheres. Eu mesma julguei, e por vezes ainda julgo, mulheres que estão num relacionamento abusivo e não saem dele, mas a verdade é que é muito mais fácil julgar.

“Por todos esses motivos e pela pressão da família (por ser uma pessoa que eu namorava a muito tempo, que todo mundo conhecia a “índole”) eu sempre acabava cedendo e voltando, mais pra me livrar dos problemas do que qualquer outro motivo. Com o passar do tempo eu sabia que não gostava mais dele, que estava nesse relacionamento pelos motivos errados. Então terminei e sustentei o término, mesmo com toda essa pressão. Contei a minha família como eu me sentia e pararam de interferir depois, porque no início lembro de minha mãe me dizendo que relacionamento era assim mesmo, que homem era assim, que depois que eu casasse com ele que ele mudaria…”
“Eu fui percebendo, porque eu sempre percebi tudo, só não tomava nenhum tipo de posição. Via e fingia que não, quando tinha alguém episódio de infidelidade ele negava, mas eu sabia que no fundo no fundo era verdade. Eu falava, poxa velho, isso não é de mim. Porque estou aceitando isso? Eu não dependo dele, eu trabalho, sou totalmente independente, eu tenho casa própria e por que estou aceitando isso? Eu sabia, sempre soube que era um relacionamento NOCIVO, mas sei lá, eu não tinha força para me libertar.”

As características principais do relacionamento abusivo são: violência (psicológica e/ou física), ciúmes e privação da liberdade, é um verdadeiro jogo de controle.

“Quando eu tinha 14 anos eu me apaixonei por um rapaz 07 anos mais velho do que eu e comecei a namorar com ele… No início por não entender o que era um relacionamento abusivo eu achava tudo normal, achava que o ciúme era demonstração de amor, de cuidado, o que estava profundamente enganada e fui descobrindo depois. Como eu tinha começado a namorar com ele muito nova, ele achava que eu nunca terminaria ou que eu era propriedade dele. Ele saia sempre (e eu sempre ficava sabendo das coisas) e eu não podia sair com meus amigos na cidade que eu morava porque era briga na certa. Essas brigas (eu não gosto nem de lembrar), era me pegando forte, eu tentava ir embora e por mais que eu tentasse eu só conseguia sair quando ele “permitia” pq usava da força pra me manter onde estávamos conversando. Um dia em uma dessas brigas, estávamos no carro, ele foi para um rio próximo, a noite, tudo escuro! É claro que eu não poderia sair de lá sem ele, sem estar no carro com ele. Namoramos no total (entre idas e vindas) por 05 anos, quando eu finalmente, depois de várias situações consegui não reatar.”

Outra característica típica, que faz com que muitas mulheres desistam de terminar o relacionamento é o ciclo da violência: Tensão – Explosão – Calmaria. Em muitos momentos, quando o relacionamento está na fase calmaria, o “cara” pede desculpa, “dá uma” de romântico arrependido, a mulher se ilude, mas o ciclo continua e ele volta à agressividade, que só vai piorando a cada dia.
“Um dia ele me chamou na casa dele, transamos. Depois, ele terminou. Ele não me queria mais, ele me achava louca, dizia que eu já estava agressiva com ele e que nosso relacionamento estava ruim. Dizia que eu fantasiava coisas e realmente eu já estava fantasiando. Brigamos feio e depois continuamos ficando.”

“Uma certa noite ele bêbado, transtornado quis me submeter ao sexo, por dizer não ele me enforcou, me bateu, e segurou tão forte em minha cintura e meu pulso que as marcas ficaram por um longo tempo. Ninguém soube, além de um amigo que viu as marcas e não pode mentir. Escondi como pude de todos a minha volta!”

As agressões podem gerar traumas tão profundos, ao ponto de acompanhar algumas mulheres pela vida toda, vale salientar também que, por vezes, a violência psicológica pode ser mais danosa que a violência física e é através dela que o abusador consegue prender a companheira na relação. Percebendo o ponto fraco e, muitas vezes, descontrole emocional, é fácil manipular, exercer total poder sobre outra a pessoa.

Portanto, fiquemos alertas aos seguintes sinais:

Chantagem (uma pessoa abusiva faz chantagens, principalmente, emocionais):

“Namorei durante 2 anos com uma pessoa. No início, tudo era bem lindo, até ele me dar um anel e começarem as cobranças.  Ter que usar o anel sempre, embora ele as vezes não usasse e tudo bem, chantagem emocional e uma coisa que todo mundo naturaliza, inclusive eu naturalizava: Falar sobre o passado com outras pessoas com um tom de “quero te contar tudo, não quero te esconder nada”. Isso vem travestido de cuidado, até você começar a achar que todas as histórias quer ele viveu antes foram melhores do que aquele vive com você. Depois vem a história de “ciclana ta dando em cima de mim” e você começa a se comparar, a rivalizar com outra mulher, excluir sua beleza diante da dela.”
“Passei 2 anos da minha vida acreditando está namorando com uma das melhores pessoas do mundo! Que me protegia da maldade das pessoas, que me alertava dizendo que minha família não queria ver minha felicidade!”

“E aí quando contei que estava grávida ele já não reagiu bem. Reagiu bem nos 3 primeiros dias porque ele pensou que eu ia fazer um aborto. Quando mostrei a ultrassom ele disse para eu tirar e aí foi quando veio aquela força, eu disse: Não tiro. Já criei um só, vou criar o outro também. Aí foi quando começaram as ameaças, ele falou que se eu não tirasse ele ia me matar, que ele sabia os meus horários de trabalho, ele sabia onde eu morava, sabia toda a minha rotina, que eu tirasse porque a de lá não poderia saber que ele me procurou e eu engravidei. Tive zica na minha gravidez, fiquei muito mal, e ele com aquela pressão psicológica que ia me matar, que ia me matar e ia se matar, que eu escolhesse entre a minha vida e a vida da criança. Que aquela criança era uma desgraça. Que ele não queria ver essa desgraça e eram palavras horrorosas, todas as palavras de maldição que você puder imaginar ele dizia sobre a vida daquela criança. Mas eu disse que não ia tirar. Mudei de número para ele não me procurar, aí eu fiquei muito nervosa no período e fiquei muito nervosa, sofri uma ameaça de aborto, fiquei uns 11 dias sangrando, internada, ainda tive a zica, fiquei a gravidez toda com medo da microcefalia e passei a gravidez toda sem ele ter nenhum tipo de contato comigo, e segui minha gravidez eu e minha filha fortes. Quando minha filha nasceu eu disse: não aceito eu ele não venha registrar. Minha filha vai saber de tudo, mas não aceito que ele não registre. A mãe dele deu meu número novo a ele e ele me ligou e disse : me dê dois dias, mas eu não quero ver a criança. Aí depois que ele registrou minha filha, as vezes ele ligava, ligava e perguntava, eu ainda guardando muita mágoa e muito rancor de toda violência que eu sofri, que sofremos, inclusive meu filho e minha filha também. “
Ciúmes:
“Um dia fomos a um show, ele brigou pelo jeito que eu dançava, falou de meus peitos, queria porque queria ir embora. Comecei a sentir dor no joelho, ai ele disse: quer remédio? Eu aceitei. Ele era meu namorado, todo mundo amava ele e mesmo com raiva ele queria cuidar de mim. Tomei. Era Rivotril, acordei na casa da tia dele, sem saber como cheguei, o que aconteceu minutos depois que tomei o remédio. Foi a pior sensação da minha vida. E acordei achando que tinha sido traída. Sim, eu não conseguia ver nada pior do que isso.”
“Meses depois, conheci uma pessoa e começamos a ficar, como temos até hoje amigos em comum, as pessoas comentaram com ele. O que foi uma loucura! O que me fez detestar ele… Ele ligou pra operadora do meu celular, passou meus dados (como namoramos por muito tempo, ele tinha) pediu o registro de ligações e mensagens, ligou pra meu ex namorado fez sérias ameaças, me ligou falando do conteúdo das msgs e que se eu não voltasse com ele, que ele iria expor pra todo mundo da cidade que ele mora, família e amigos. Foi um verdadeiro inferno! Novamente, conversei com minha família e disse a ele que iria processar ele e dar uma queixa, por todos os motivos aqui relatados se ele não me deixasse e se não deixasse meu ex namorado em paz.”

Promessas (uma pessoa abusiva sempre promete que vai mudar):

“Terminei! E depois de várias insistências e arrependimento, voltamos! Ele me prometeu nunca mais acontecer! Realmente não houve mais agressão, a gente voltou a se dar bem! Ele me pedia pra não cortar o cabelo e eu usava apenas um lápis de olho como maquiagem, pra não chamar atenção! Após a agressão ficamos juntos apenas mais quatro meses, eu havia encontrado alguém que zelava por mim e fazia de tudo pra me ver bem! Ele não permitiu que eu seguisse, me pedia sempre pra voltar, dizia que me amava e que não havia ninguém que ele precisasse tanto quanto eu!”

“Quando eu falei ele aceitou bem a gravidez, ele terminou o outro relacionamento que ele estava e aí a gente ficou junto o período da minha gestação, mas mesmo o período da minha gestação ele tinha outras e mesmo assim eu aceitava. Ele dizia que não e eu dizia que sim, ou fingia que acreditava.”

Superioridade (uma pessoa abusiva gosta de se exaltar, sempre está correta e inferioriza x campanheira) :

“Por mais que eu tentasse terminar, não conseguia, pq era o tempo todo no meu pé com violência psicológica (eu estava bem acima do peso nesse período e ele dizia que se eu terminasse com ele que eu não encontraria ninguém) e eu acreditava, acreditava também que isso era a justificativa para todas as traições e humilhações que eu passava.”
“Fiquei uma mulher muito insegura, já não tinha auto estima e fiquei no limbo, mendigando afeto, implorando pra ele ficar, porque achava que se ele fosse embora eu não era nada. Enquanto estávamos juntos, era tudo ótimo, mas quando outras pessoas se juntavam a nós, aquilo era aterrorizante. Lembro que tinha medo dele me trair, vasculhava tudo que eu podia, celular, facebook, mas não achava nada. Algumas meninas davam em cima e ele dizia que tinha namorada, sempre achei que o pior que poderia acontecer era ele me trair, hoje sei que o pior que poderia acontecer, aconteceu: eu estava submissa emocional de alguém.”

Punição (a pessoa abusiva priva x companheira de afeto, atenção e muitas vezes de sexo):

“Ele nunca me agrediu, ele nunca me ofendeu com palavras de baixo calão, mas quem disse que precisa? São pequenas coisas com tons despretensiosos que transformam você em uma louca. O tempo todo os amigos dele me excluíam das coisas, iam me colocando distante e quando eu cobrava algo eu sempre tava pedindo demais, ninguém nunca ia me entender ou dizia que jamais alguém me amaria como ele me amava. Por anos acreditei nisso… Liguei pra ele e disse que ia me matar, pois eu não suportava mais sofrer por alguém que não me queria. E ele disse: faz isso, se você fizer, eu vou no teu enterro e choro. É isso que você quer? ”

“Dois anos encantada por alguém que não me presenteava, não me elogiava, não saia comigo. Não sei o que é ter uma foto juntos! Quando lembro penso que eu podia tá louca esse relacionamento nunca houve rsrs não há fatos que comprovem isso! Passava 7hrs pendurada ao telefone, pq morávamos longe um do outro e ele vinha me ver uma vez em cada dois meses, ficava algumas horas comigo e saia com os amigos!”

 “Quando nós estávamos morando juntos, eu percebia que ele dormia tarde, ou chegava na cama 5 horas da manhã, mesmo a gente com bebê pequeno. Ele falava que estava estudando para concurso, que não era nada disso e quando não era na sala até tarde ele se trancava no carro, na garagem, para ficar conversando até tarde.”

Depois de analisar as principais características de um relacionamento abusivo e conhecer os relatos de outras mulheres, reveja o seu relacionamento, o comportamento dx seu/sua companheirx e se por acaso você se der conta que está num relacionamento desse, saiba que não é a única e que não está sozinha. É difícil terminar, mas tenha força e coragem. Segue os relatos de superação e palavras de apoio de quem já passou por isso.

“Se hoje eu corro dos relacionamentos abusos é porque aprendi na dor o que eles causam. Depois de tudo isso, me descobri lésbica e hoje tenho um relacionamento estável, feliz e nada abusivo! Recentemente, ele ainda me mandou uma msg, acho que sabendo de todo mal que me fez, queria saber se eu ter virado lésbica tinha alguma coisa relacionada a ele ou ao “relacionamento” que tivemos… primeiro dei muita risada (não sei o que leva uma pessoa a achar que é o centro da vida de outra) e depois respondi que ele foi uma merda de namorado, mas que nada da minha vida dizia respeito ou menção a ele! E foi mais ou menos isso… hoje ainda encontro com ele, não sinto mais raiva e sei que o problema não fui eu, sei que independente do que falem, eu como toda pessoa, sou digna de ser amada e feliz!!! Chega me arrepiei toda, só de lembrar rs”

“Durante todo meu período de degradação emocional, de depressão, de angústia, de medo, de não aceitação, eu não encontrei só ele de abusivo. As pessoas a minha volta diziam: “sério que ainda não superou? Aff, dois anos!”, “é, ele ta pegando tal pessoa”, “tu ainda se incomoda com ele?”. A minha amiga de infância ficou com ele e eu só ouvia “tenha sororidade”. As pessoas não entendem que de uma relação abusiva, outras dez nascem. Tratam sempre alguém como vilão e outro como mocinha. E esquece que quem encoraja homem a ser escroto e mulher a ser submissa são as outras relações abusivas que os cercam. Isso é uma construção social, temos que ter paciência e empatia pra desconstruir.”

“Já são 3 anos e meio que não me envolvo com ninguém, optei em cuidar de mim, do meu coração, tenho orgulho da mulher que estou me tornando, e sou grata a vida por hoje não está em outras estatísticas, onde ficaria impedida de hoje contar um pedacinho das minhas dores! Quero pedir que sejam fortes! Olhem para o espelho e vejam a mulher que cada uma é! Não se sabotem! Não se reprimam! A vida é linda e somos uma fábrica de amor, basta saber para quem o doamos!”

“Eu tenho consciência de que não quero mais isso. Eu não digo para você que não gosto, eu gosto, mas não me faz bem, não é um relacionamento sadio, agradável, porque é um relacionamento onde impera o não respeito, a hegemonia de poder: onde ele pode e eu não posso, e eu sou muito mais que isso e eu não quero nada que não me agregue, não quero ficar doente, eu não quero ficar pensando qual será a próxima traição, eu não quero emagrecer 20 quilos como emagreci na minha primeira separação, que não ser violentada, ser ameaçada de morte, então independente de hoje nós termos uma relação pacífica é prova de que eu não quero nada disso para minha vida, porque quem fez uma vez pode fazer mil. Então eu digo para todas as mulheres que não se permitam, não se permitam, não é orgulho, isso é valorização de você enquanto gente, enquanto mulher, não se permita ser humilhada, hostilizada, menosprezada, porque não faz bem, a pessoa deixa de viver outras experiências, por uma coisa que não vale à pena.”

“A vida é linda e somos uma fábrica de amor!”


P.S.: A denúncia de violência doméstica pode ser feita em qualquer delegacia, com o registro de um boletim de ocorrência, ou pela Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180).







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